sexta-feira, 12 de agosto de 2011

A origem da comida exótica- Pato no tucupí e Maniçoba


Conta-nos uma lenda – chamada da primeira água – que Jacy (Lua) e Iassytatassú (Estrela d’Alva), combinaram um dia visitar Ibiapité (Centro da Terra).
Em uma madrugada deixaram Ibacapuranga (Céu Bonito) e desceram para a terra. Descansaram no enorme disco da Iupê-jaçanã (Vitória-Régia) e se puseram a caminho para o centro da terra. Quando as duas se preparavam para descer o Ibibira (abismo), Caninana Tyba mordeu a alva face de Jacy que, sentindo a dor, derramou copiosas lágrimas amargas sobre uma extensa plantação de mandioca.
Depois disso, a face de Jacy nunca mais foi a mesma pois as mordidas da caninana, marcaram-na para sempre.
Das lágrimas de Jacy surgiu o tycupy (tucupi).
O tucupi é ácido cianidrico.


Todavia, as nossas avoengas descobriram que poderiam vencer esse veneno deixando-o exposto ao sol por três ou quatro dias ou, então, depois de “descansado” (tempo em que a tapioca sedimenta-se no fundo do vasilhame), é fervido, ficando o tucupi pronto para o consumo humano.
Dessa massa (a tapioca) e da pimenta murupi surgiu a primeira iguaria exótica, nascida da sapiência das nossas avós amerabas.
Os autóctones desconheciam o sal. E o arubé, apesar de ardente, era o que dava um gosto às comidas ensossas, além do que a sua causticidade as tornava mais saborosas.
De exotismo em exotismo, surgiu a tiquara, que chegou até nós como o nome de chibé.
A tiquara, ou chibé, nada mais é que a farinha de mandioca, com a água fresca dos igarapés, bebida em uma cuia pitinga.
Houve na história do Pará um instante onde o humílimo chibé foi reconhecido como alimento.
Ia acesa a Revolução Paraense, infamantemente conhecida por Cabanagem. As tropas legais reclamavam por alimentos.
O marechal Manuel Jorge, irado com os protestos, perguntou aos reclamantes:
- E os sediciosos o que é que comem?
Os perguntados responderam:
- Chibé!…
- Então, comam-no também, respondeu o marechal mal humorado.
OS ÍNDIOS FOGEM
Quando da descoberta do Brasil viviam na faixa larga da mata atlântica vinte e cinco milhões de ameríndios. A matança foi impiedosa e os autóctones tornaram-se nômades. Guiacurú, Temimino, Carijó, Aymoré, Tamoio puseram-se a andar, perseguidos implacavelmente pelo civilizado.

Aí as nossas avoengas mostraram para o que vieram. Responsáveis pela manutenção dos alimentos para os seus filhos, traziam em grandes cabaças o tucupi, o jambu, a carne de caça moqueada ou peixe, prática que elas haviam descoberto muito antes.
Era deliciosa a carne de anta moqueada com o tucupi ou então a folha da maniva, mascada pelas mulheres da taba em tempos de paz. Mascavam-na à beira de um igarapé corrente, para que a água lavasse a maniva desse modo triturada.
Se a carne moqueada no tucupi conservava-se por oito dias, a maniva cozida com carne de caça durava quinze dias.


Esse uso e costume deu origem a dois pratos exóticos da Amazônia – o pato no tucupi e a maniçoba – e ainda uma outra bebida, agora já com requintes de sabedoria das mulheres amazônidas, o tacacá.
Os últimos bolsões dos amerindios foi o Sul da Bahia e eles encetaram a grande marcha para o vale amazônico na metade do Século XVI. Nessa caminhada foram distribando-se. Belém ainda não havia sido fundada.